Dois palhaços e uma alcachofra: uma leitura do romance A ressurreição de Adam Stein, de Yoram Kaniuk (2000)
- Authors:
- Autor USP: AMANCIO, MOACIR APARECIDO - FFLCH
- Unidade: FFLCH
- Sigla do Departamento: FLO
- DOI: 10.11606/T.8.2000.tde-04012023-173849
- Assunto: LITERATURA HEBRAICA
- Language: Português
- Abstract: Este trabalho é fundamentalmente baseado na leitura do romance Adam Ben Kelev, ou A Ressurreição de Adam Stein, como foi publicado no Brasil, escrito pelo ficcionista israelense Yoram Kaniuk. É um romance sobre um palhaço judeu alemão que vive na Alemanha e é aprisionado com a família pelas forças nazistas durante a Segunda Guerra Mundial. Uma vez no campo de extermínio, ele é reconhecido pelo Comandante Klein, que demonstra sua gratidão ao palhaço por ter este salvo sua vida quando estava prestes a cometer suicídio: as piadas e a pantomima funcionaram tão bem que fizeram-no mudar de idéia. Klein então chama Adam Stein para a mesa de negócios e diz que ele pode viver trabalhando no campo de extermínio como palhaço para divertir os judeus antes da execução. Há, no entanto, uma séria cláusula: Adam deve viver como um cão, de quatro, sendo ao mesmo tempo companhia e rival de Rex, o pastor-alemão de estimação de Klein. O palhaço concorda e representa para sua mulher e filha e todos os judeus antes que sejam transformados em fumaça. Adam sobrevive, torna-se um homem rico e tenta viver na Alemanha, mas decide mudar-se para Israel depois de ser informado de que sua outra filha está lá, casada e grávida. Desafortunadamente ela morre antes do esperado encontro entre pai e filha. Então Joseph, o marido, leva Adam para visitar o túmulo dela e diz ao seu engraçado sogro para representar então. Adam enlouquece, transforma-se novamente em cão e élevado para o hospital. Hámuitos internos: o instituto é comparável aos campos de extermínio. A última internação ocorre depois que Adam tenta assassinar sua amante. Ele então vai para o instituto construído no deserto por uma benemérita norte-americana, uma mulher lunática que é induzida a crer que pode antecipar a vinda do próprio Messias. E um bando de lunáticos, a maior parte deles sobrevivente do campo de extermínio, como Adam, acredita que o palhaço é ungido. kaniuk justapõe ) o circo, o campo e o instituto para criar uma fábula fantástica, cômica e pungente sobre o poder, sobre o drama pessoal e coletivo em nossos tempos pós-Shoá, ou pós-modernos. O ponto de partida do trabalho é a expressão artística de acordo com autores como Bakhtin, Foucault, Fredric Jameson, Jean Baudrillard, Linda Hutchon e Marjorie Perloff, Deleuze e Guattari, Carlos Rincón, Umberto Eco e outros que contribuiram de modo importante para a compreensão desta época excepcionalmente complexa, sua arte e seus artistas. Deve ser lembrado que, no caso de um livro e um autor israelense, isso é ainda mais complicado, porque ao contexto internacional dos vários pós, adiciona-se a situação especial de Israel na sua fase pós-sionista. Kaniuk, como outros escritores pós-modernos, elabora uma dura sátira contra a política local e global, o Sionismo, o capitalismo e todos os tipos de religião que se possam encontrar. Alguns têm criticado Kaniuk por não ter sido capaz de obter um tipo de texto equilibrado emconformidade com os modelos tradicionais. Mas o leitor pode concluir que esse romance é uma obra de arte desequilibrada e imperfeita porque a perfeição é algo que pertence aos bons velhos tempos anteriores à devastação nazista, que é apresentada como o auge da civilização ocidental. Assim, a imperfeição está no âmago da obra e decorre das intenções críticas radicais do autor. Para mostrar essas intenções de modo mais claro, e os ambiciosos objetivos do autor, tendo em mente que este é sobretudo um trabalho sobre a experiência judaica em nosso tempo, comparo o romance com um tipo de expressão artística bastante diferente: a arquitetura, como podemos ver na obra pós-moderna de Frank O. Gehry. Ghery tornou-se internacionalmente famoso por fazer uma confusão do ponto de vista humanístico, tratando a perspectiva "normal"com um estilo desconstrutivo. O mesmo ocorre no romance de Kaniuk. Ao longo do estudo procuro ) encontrar pontos em comum nessas obras aparentemente distantes. Além da era pós-moderna de ambos (Gehry nasceu em 1929, Kaniuk em 1930), têm algo mais em comum, e isso é importante. Eles são artistas judeus. Na obra de Kaniuk sua judeidade é óbvia, o que não é o caso de Gehry. Mas nós vemos reflexos de sua judeidade na famosa casa de Santa Mônica (Fredric Jameson percebeu isso de modo bastante agudo, como é usual), por exemplo: a instabilidade é expressa por todos os meios à mão. O uso de materiais baratos, a mudança que não é mudança, a presença do velho nonovo, etc. Nós podemos ver sinais disso no seu próprio nome de família, que no passado foi Goldberg. Ele explicou que decidiu alterar o nome por causa do anti-semitismo. Muitos anos mais tarde, confessou estar arrependido por causa dessa dramática decisão. Eu tentei juntar dois artistas judeus aparentemente tão distantes - um israelense, um sabra, o outro um canadense-americano - como exemplos da experiência judaica em nosso tempo. Minha intenção era explicar como esses artistas podem fazer com que as pessoas percebam a problemática situação da humanidade diante da Shoá, que continua a afetar judeus e não-judeus ao mesmo tempo e de muitas e insuspeitadas maneiras. Quero dizer que essa pode ser a experiência silmultânea de homens e mulheres - no sentido global - cujas mentes e corpos eram e continuam a ser usados para alimentar a indústria da morte de modo tão ridículo quanto terrível
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- Data da defesa: 21.12.2000
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ABNT
AMÂNCIO, Moacir Aparecido. Dois palhaços e uma alcachofra: uma leitura do romance A ressurreição de Adam Stein, de Yoram Kaniuk. 2000. Tese (Doutorado) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2000. Disponível em: https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8152/tde-04012023-173849/. Acesso em: 18 nov. 2024. -
APA
Amâncio, M. A. (2000). Dois palhaços e uma alcachofra: uma leitura do romance A ressurreição de Adam Stein, de Yoram Kaniuk (Tese (Doutorado). Universidade de São Paulo, São Paulo. Recuperado de https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8152/tde-04012023-173849/ -
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Amâncio MA. Dois palhaços e uma alcachofra: uma leitura do romance A ressurreição de Adam Stein, de Yoram Kaniuk [Internet]. 2000 ;[citado 2024 nov. 18 ] Available from: https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8152/tde-04012023-173849/ -
Vancouver
Amâncio MA. Dois palhaços e uma alcachofra: uma leitura do romance A ressurreição de Adam Stein, de Yoram Kaniuk [Internet]. 2000 ;[citado 2024 nov. 18 ] Available from: https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8152/tde-04012023-173849/ - Sagração profana: Aproximações à poesia de Yona Wollach
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Informações sobre o DOI: 10.11606/T.8.2000.tde-04012023-173849 (Fonte: oaDOI API)
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